Julgamento de Moro tem placar de 1 a 1: as diferenças entre o voto que absolve e que condena o senador | Política

por Redação 14 Leitura mínima

Restam os votos de cinco desembargadores. Na sessão de quarta-feira (3), o presidente do TRE-PR, Sigurd Roberto Bengtsson, registrou seu desejo de ver o julgamento terminado nesta segunda-feira (8). Segundo ele, seus colegas agora têm à disposição, se desejarem, duas teses para avaliar e optar por qual seguir.

O PL e a federação formada por PT, PV e PCdoB acusam Moro de, entre outros crimes, abuso de poder econômico por gastos excessivos realizados na pré-campanha da eleição de 2022. Moro foi eleito com 1,9 milhão de votos (33,5%). Saíram derrotados Paulo Martins (PL), com 29%, e Álvaro Dias (Podemos), com 23,9%.

O voto pela absolvição é do relator, desembargador Luciano Carrasco Falavinha Souza. Já José Rodrigo Sade defendeu a condenação. Ele foi recém-nomeado para Corte pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A partir das leituras dos votos e das manifestações nas sessões, é possível identificar as principais divergências entre eles. Veja, ponto a ponto, abaixo:

Ponto relevante no embate entre acusação e defesa é calcular quanto de fato a pré-campanha de Moro gastou, considerando o período em que ele esteve no Podemos (e cogitou disputar a Presidência) e quando já estava no União Brasil, partido pelo qual foi eleito senador.

Um complicador nesse tipo de ação é a ausência de limites e regras claras na legislação sobre o que é permitido na pré-campanha.

Para fazer a conta, PL e PT somaram despesas diversas, como viagens, contratação de serviços de comunicação, de segurança e locação de espaços. Os resultados variaram. O PL falou entre R$ 5,5 milhões e R$ 7,4 milhões. O PT chegou a somar R$ 21,6 milhões.

A defesa de Moro diz que nem tudo pode ser computado e é preciso individualizar gastos, já que algumas despesas bancadas pelo Fundo Partidário beneficiaram também outros candidatos. A conta do senador fechou em R$ 141 mil.

O Ministério Público eleitoral (MPE) chegou a R$ 2 milhões. O valor é inferior ao da acusação, mas o suficiente para configurar gasto excessivo, segundo o procurador-regional eleitoral Marcelo Godoy. O montante representa 39% do total das despesas contratadas na campanha oficial. Mesmo sem um critério definido em lei, lembra Godoy, o valor supera os 10%, um limite que poderia ser considerado razoável e já adotado em decisões anteriores.

O que diz o relator, Luciano Falavinha Souza:

Ele calculou R$ 224,8 mil, o que corresponderia a 5,05% do teto de gastos de campanha ao Senado do Paraná. O relator disse ainda que os partidos adversários lançaram despesas “a esmo” e chegaram a valores “utópicos”. A interpretação ampara seu voto pela absolvição de Moro.

O relator individualizou as despesas (só aquelas com relação direta ao senador) e desconsiderou, por exemplo, remunerações pagas pelo partido e serviços advocatícios. Tirou da conta também despesas com segurança particular e blindagem de veículos por entender que não têm relação com a campanha “nem aptidão para promover a imagem de pré-candidatos ou candidatos”.

Desembargador Luciano Carrasco Falavinha Souza, relator das ações contra Sergio Moro no TRE-PR — Foto: Divulgação/TRE-PR

O gasto com segurança, em especial, foi tema de embate com Sade. Para o relator, não cabe considerar como gasto de campanha uma despesa necessária para a proteção da vida.

“É evidente que a contratação de segurança pessoal não possui aptidão a fomentar a candidatura e atrair votos; ao revés, pode até mesmo representar obstáculo à aproximação com o eleitorado.”

O que diz José Rodrigo Sade:

O desembargador adotou como parâmetro o cálculo do Ministério Público Eleitoral, de R$ 2 milhões. Ele listou em seu voto parte dos gastos levantados, entre eles os relacionados a serviços de segurança, que somam R$ 535.185,22.

Para Sade, não é possível dissociar certas despesas de gastos de campanha por serem custeadas com dinheiro público. Além disso, complementa, mesmo despesas “instrumentais” (como segurança e alimentação da militância) auxiliam “no desenvolvimento da estratégia de campanha”.

Com base nas notas apresentadas e nos registros das agendas, Sade entendeu que são muitas as provas e os cálculos, “elevadíssimos”. Os valores, somada à exposição nacional que Moro teve quando cogitou concorrer a Presidência, geraram desequilíbrio e “indevida vantagem” ao senador ante os demais candidatos ao Senado.

“(…) a existência do abuso é patente e verificável de per si, independentemente de considerações sobre o efetivo impacto e resultado do pleito. Basta a comprovação dos fatos abusivos, no caso, o uso excessivo de recursos financeiros, para que reste configurado o ilícito eleitoral”, escreve Sade.

Onde e quando o dinheiro foi gasto

Enquanto esteve filiado ao Podemos, Moro participou de eventos em diversos Estados para promover a pré-campanha à Presidência. Quando abandonou a ideia e migrou para o União Brasil, o ex-juiz tentou transferir seu domicílio eleitoral para São Paulo para concorrer a uma vaga no Legislativo. Em junho de 2022, porém, a Justiça Eleitoral rejeitou a transferência. A partir de então Moro foca na campanha ao Senado pelo Paraná.

Falavinha Souza entende que devem ser consideradas apenas as despesas de atos e eventos realizados no Paraná, o que ocorre a partir de 10 de junho de 2022. Para ele, essas teriam eventual poder para desequilibrar o pleito. Esse recorte ajuda a entender por que a conta de gastos feita pelo relator diverge das feitas pelo MPE e pelas acusações.

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O relator também diz que os adversários de Moro não demonstraram se ou quais as ações anteriores (na pré-campanha presidencial) foram direcionadas ao território paranaense, o que poderia ser interpretado como tentativa de interferência indevida na campanha ao Senado.

Para o relator, portanto, não cabe somar todos os gastos sem ao menos indicar a correlação entre as despesas e os atos eleitorais feitos no Paraná.

O desembargador disse que olhou as “provas como filme, não como fotografias”. Para ele, todos os eventos antes da campanha oficial têm consequência, ainda que Moro não tenha agido por má-fé nem tido a intenção de, desde o início, concorrer ao Senado.

“Com efeito, para mim não parece possível simplesmente apagar os caminhos que o pré-candidato em questão percorreu quando ainda estava pré-candidato presidencial. Não se apaga o passado”, diz no voto. Ele acrescenta que, em tempos de redes sociais e internet, é indiferente onde determinado evento ocorreu, já que o alcance dos conteúdos ultrapassa limites geográficos.

Ao TRE-PR, a defesa do senador também tentou argumentar que Moro já era figura pública conhecida por causa da atuação na Operação Lava-Jato, em especial no Paraná, o que tornaria a pré-campanha irrelevante para o desfecho da eleição. Mas para PL e PT, houve superexposição do então candidato, o que quebrou as condições de isonomia (igualdade) com seus adversários.

Falavinha Souza concordou com a defesa. “Até as pedras sabem que o investigado Sergio Moro não precisaria realizar pré-campanha para tornar seu nome popular”, afirmou o relator.

Esse argumento, em específico, foi adotado pelo relator também para rebater a prática de um outro crime eleitoral, o de uso indevido dos meios de comunicação. Nesse ponto, Falavinha, MPE e Sade concordam. Para nenhum deles ficaram provados os demais crimes apontados pela acusação. Sade, no entanto, discorda que a “grande fama” de Moro sirva de argumento.

Para o desembargador, “não passa de retórica” afirmar que os investimentos não afetaram a eleição por causa da notoriedade pregressa do ex-juiz.

“Caso essa fama fosse suficiente para, por si só, alçá-lo ao cargo pretendido, não faria sentido os partidos destinarem à sua pré-candidatura a quantia absurda de dinheiro que aplicaram, bastando aguardar as eleições”, escreve no voto. A despeito da fama, acrescenta, foi necessário construir “a imagem do ex-juiz transformando-o em homem público atrás de voto”.

A expressão “downgrade de candidatura” é recorrente no processo. Ela é usada quando um pré-candidato desiste de um cargo para concorrer a outro inferior, a exemplo do que fez Moro: de presidente para senador. A mudança é prevista e legal.

A questão são as despesas. O teto de gasto da campanha presidencial é o mais alto de todos. Logo, quando desistiu do Planalto, Moro entrou na campanha oficial já com despesas que, para a acusação, eram desproporcionais para disputar o Senado.

Falavinha argumenta que, se Moro for condenado, a Justiça Eleitoral criará um precedente perigoso e que vai comprometer o “jogo político”. Ele lembra que não há provas de que Moro tenha dissimulado ou escondido suas intenções de, desde sempre, disputar o Senado e tirar proveito da pré-campanha à Presidência. O relator citou outros casos: Eduardo Leite (PSDB), que tentou o Planalto mas disputou e foi eleito para o governo do Rio Grande do Sul; e André Janones (Avante-MG), que também desistiu da Presidência e foi eleito deputado federal.

Por esta razão Falavinha reitera que a mera soma de gastos é equivocada e, se adotada sem critério, inviabilizará o livre exercício político.

O desembargador não ignora a possibilidade legítima de “downgrade”, mas defende que o candidato tenha um planejamento financeiro para, em caso de mudança, evitar o risco de abuso de poder econômico.

Para Sade, é irrelevante saber se Moro tinha ou não interesse de mudar sua candidatura. “O que se tem de concreto é que, até 2.10.2022 [data do primeiro turno], acabou ele [Moro] gastando ou investindo muito mais recursos do que os demais candidatos que disputaram com ele a vaga única de senador, justamente porque, até determinado ponto de sua jornada eleitoral, seus gastos tinham por base o teto de uma campanha presidencial, o que, a meu ver, implicou num completo desiquilíbrio do pleito em questão.”

A cassação da senadora Selma Arruda (MT), em 2019, é citada por todas as partes, seja para usá-la como precedente ou para afastar qualquer semelhança. Em resumo, a juíza aposentada foi condenada por abuso de poder econômico e caixa dois na campanha eleitoral de 2018.

Falavinha Souza não vê conexão entre os dois processos. Para o relator, não é possível comparar a natureza dos gastos nem a origem dos recursos, já que no caso de Selma tratava-se do dinheiro dela, além de doações irregulares e de falhas na prestação de contas – práticas inexistentes na ação contra Moro.

O relator sugere que o processo da ex-senadora é usado pela acusação para justificar a ausência de provas contra Moro.

“A realização do suposto financiamento de Selma para ela mesma, somada as despesas que ela fez, é que deu ensejo ao excesso. Era um dinheiro que ela deu para campanha, que ela utilizou, era só candidatura ao Senado. (…) Este caso [Sergio Moro] extrapola a mera aplicação de um precedente, extrapola a mera aplicação de uma soma, sob pena de inviabilização de qualquer candidatura futura”, frisou o relator.

Sade diz haver “muitos pontos de aproximação” com Moro. Em seu voto, ele destacou trechos da decisão que cassou Selma Arruda, e frisou a ocorrência de gastos “tipicamente eleitorais” na pré-campanha e “utilização excessiva” de recursos.

“Como dito, a situação é bastante similar: ex-magistrada que ingressa na política, disputa vaga para o senado e se vale de vultosos aportes financeiros na pré-campanha, antecipando gastos eleitorais. Nos presentes, a situação é ainda mais grave, uma vez que também restou configurada a extrapolação do teto de gastos, questão que não se configurou no precedente”, afirma Sade no voto.

Desembargador José Rodrigo Sade, do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) — Foto: Reprodução/TRE-PR
Desembargador José Rodrigo Sade, do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) — Foto: Reprodução/TRE-PR

Fonte: Externa

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